Acredite nos que buscam a verdade... Duvide dos que encontraram! (A.Gide)

26 dezembro 2008

MINHA CONVERSA NATALINA [catabólica e anabólica] COM O MONGE JOSEFUS


Este ano meu tradicional desconforto com o Natal parecia estar com um sabor diferente. Não conseguindo decifrar, resolvi visitar o monge Josefus em seu casebre à beira-brejo.

Comecei tateando: como expor o que ainda não se sabe o que é? Mas mal pronunciei "desconforto com Natal", Josefus atalhou:

- Você então é mais um dos que reclamam que o Natal virou só comércio e comilança, e perdeu a essência espiritual?...

Percebi um quê de ironia que me incomodou um pouco.

- Bom, eu costumava dizer isso, mas agora parece que surgiu algum outro desconforto... De qualquer modo isso não está errado, né - ou o senhor acha que está, monge Josefus?

- Ou sou monge ou sou "senhor", não dá pra ser os dois ao mesmo tempo...

- Tá bom, desculpe. Mas enfim, o que foi que o senh... que você quis insinuar?

- Que não vejo sentido em o cristianismo reclamar de lhe usurparem uma festa que nunca foi dele. Que ele mesmo tentou usurpar.

- Usurpar soa pesado, não acha?

- Não reconhecer o peso das coisas pesadas nunca levou a nada de bom. A palavra não deveria ser usada pra desconversa, pra falsear. É usada quase exclusivamente pra isso mas não deveria... Enfim, você tem noções razoáveis de história e de antropologia, não?

- É, um pouco...

- Mas com certeza sabe que as festas de mudança de estação já existiam milhares de anos antes do cristianismo, talvez dezenas de milhares. Pausas pra tomar fôlego entre as atividades diferentes que as diferentes estações exigiam. Comemorar desfrutando do que se conseguiu produzir com tanto esforço, dar uns dias de férias ao esforço e à seriedade - até mesmo para a capacidade de esforço e seriedade se refazerem, pois já se sabia que novos trancos sempre vêm: mesmo quando a humanidade não tinha inventado necessidades artificiais, a natureza se encarregava de nunca nos deixar na pura moleza...

... E então: se os cristãos queriam comemorar o nascimento do seu inspirador, por que não criaram uma festa nova pra isso? Se é verdade que Jesus trouxe algo novo na história da humanidade, por que comemorar com o que havia de mais velho?

- Ora, monge Josefus, você sabe muito bem que os cristãos cultivam essa idéia estranha: que se um caminho leva até o alto do morro, todos os outros só podem levar a abismos e devem ser destruídos. Como se os morros tivessem um lado só... E então a intenção era justamente destruir costumes antigos colocando os seus no lugar.

- Tem razão, mas digo mais: dois séculos haviam deixado claro que costumes antigos não se deixam suprimir tão facilmente. Então passaram à tática de não tentar suprimir e sim invadir costumes alheios e lhes atribuir significados novos - como se faz ainda hoje quando as igrejas se apossam de estilos musicais criados fora dela, expressões legítimas de outros anseios e experiências dos jovens e do povo em geral, e lhes atocham palavras religiosas que não têm nada a ver com o que a música expressa... Às vezes até fica bonito, mas no fundo é uma tapeação, um engodo...

- Mas monge, você sabe que com isso os cristãos pretendem introduzir luz onde há escuridão, onde as pessoas estão perdidas...

- Pretendem. Mas deviam começar a abrir os olhos para a realidade da história. Onde os cristãos tomaram conta, geralmente o estado de coisas retrocedeu; conquistas luminosas do pensamento, realizadas com atitude humanista, foram abandonadas e substituídas por modos de vida supersticiosos e opressivos... Estude um pouco da história concreta, documentada, e veja: quem representou luz, quem representou trevas a maior parte do tempo?

- Mas, peraí... como é que o senhor, um monge, vem me dizer essas coisas? Parece que não quer deixar pedra sobre pedra do edifício cristão... Desse jeito era melhor eu ter pego direto um livro de Nietzsche...

- Teria sido, se a sífilis não tivesse botado os miolos do coitado do Nietzsche crescentemente em curto, fazendo ele introduzir uma porção de bobeiras novas lá onde deveria ter deixado um chão realmente limpo, na sua sagrada missão de demolição.

- Mas, monge Josefus!...

- Pois é preciso mesmo não deixar pedra sobre pedra, se ainda for para a semente plantada por Jesus germinar e crescer. Em cima dela era pra ter crescido uma planta viva, não um edifício.

- !!!

II

- No fundo está tudo lá no começo do Evangelho de João: o que está no princípio de tudo é lógos: tem a forma de uma fala, um discurso... Costumam traduzir por "Verbo" ou por "Palavra", mas isso ainda é metáfora, metonímia de parte-pelo-todo: "palavra" como unidade seria léxis, não lógos.

... Lógos é o teor de informação que existe em cada coisa fazendo-a ser o que é, e não um pedaço de substância informe. De certa forma o programa de cada coisa, programa que é lógico: teria cabimento um lógos que não fosse lógico?

... Mas a palavra pro-grama não é muito boa porque significa "escrito antes", sugere uma coisa pré-fixada, rígida, e o lógos é como o programa em feitura e desenvolvimento nas mãos do programador; ou melhor: na mente do programador, a qual se torna una com o programa enquanto o pensa e desenvolve: ela é o programa ("o Verbo estava com Deus, e Deus era o Verbo" - é essa a ordem das palavras no original).

... E se por um lado não há separação entre Deus e sua Fala, por outro essa Fala tampouco está antes ou fora, e sim durante e dentro das coisas que "surgiram por meio dela" - ou pelo menos não fora ou antes das coisas: quem somos nós para declará-la limitada?

... Ou talvez mais precisamente esteja dentro-e-durante de tudo o que está vivo, em processo: "o lógos era a vida". Para quem consegue ler com a mente limpa de doutrinações anteriores, é evidente que o autor não está falando de outra vida, mas da vida - que, aliás, comparece no texto vestida em sua linda palavra "zoé".
E essa vida ainda por cima é "a luz" - e "a luz que ilumina todo homem que vem ao mundo".

- Mas não é "a luz que vem ao mundo e ilumina todo homem"?

- Não, meu caro, no texto grego "que vem ao mundo" se refere a "todo homem", e não a "luz"...

- Eita!...

- Repare que pelo menos até aqui não existe nem um conflito com a descrição do mundo das ciências atuais: a vida que existe e atua nos nossos corpos é luz, energia que chegou à Terra em forma de luz, literalmente. Mas não só a atividade é energia: a substância básica de tudo também é energia, a qual assume sua multiplicidade de formas mediante a informação que a configura (com uso de ainda mais energia).

... Onde termina a informação, onde começa o corpo da luz? Como separar? Não são uma coisa só, mas também não são duas separadas... Uma está com a outra ou é a outra? Não há como determinar um limite interno e... Quem diria! Então a estranheza que o primeiro versículo de João sempre causou não é diferente da estranheza que o pensamento quântico nos causa!...

- Você está querendo dizer "a ciência já decifrou toda a charada"?

- De jeito nenhum! O nível quântico continua enigmático... e além disso aí entram coisas que não são só questão de ciência: eu havia deixado de fora uma palavra da fala de João sobre a luz: "a luz não-enganosa que ilumina todo homem que vem ao mundo". Geralmente se traduz como "verdadeira", mas é interessante que para os gregos só é possível nomear verdade negativamente: é a "ausência de mentira", o "não-enganoso".

... Quer dizer: entra com essa palavra um elemento de julgamento: não é tudo igual; se existe o verdadeiro e não-enganoso, então também pode existir o enganoso. E também está dito: quando a luz "veio para que lhe era próprio", para o mundo "que havia vindo a ser através dela", esse mundo "não a reconheceu" e "o que lhe era próprio não a acolheu ... mas aos que acolheram lhes deu potência de virem a ser filhos de Deus". Entramos em um mundo de cognição (não reconheceu) e de escolha (acolheu x não acolheu), e portanto de liberdade... questões não só de ciência mas de consciência.

... Talvez possa até dizer que aqui começa a fé, nessa história toda. Até aqui tínhamos uma descrição científica; fatos físicos, químicos, biológicos. Mas aqui estamos apostando que essa mesma luz que é vida e atividade mental-neuronal em nós, que essa mesma luz seja capaz de processar uma coisa chamada "sentido", não só reconhecendo sentidos como também criando e atribuindo, e não só criando e atribuindo mas também reconhecendo.

... E mais: apostando que, uma vez tendo virado as formas individualizadas que nós somos, a luz-que-somos-nós seja capaz de escolher - e isso até a escolha-limite que é a entre aceitarmos essa condição de seres capazes de efetiva escolha consciente ("potência de tornar-se filho", ou seja: de ter em si a mesma natureza do pai-do-escolher, da matriz universal da voluntariedade) ou nos deixarmos de fora desse grau superior de responsabilidade.

- Pára, pára!... Quer que eu fique louco com tudo isso de uma vez?

- Tudo isso? Mas foram só dois passinhos pequenos... E o mais importante deles ainda está por vir.

- Será que eu dou conta?

- Claro; já atravessamos o campo e estamos na boca da área...

- !

- Mas antes de partir pra finalização eu preciso ressalvar uma coisa, sobre o que eu estava dizendo: não pense que estou entrando pelas concepções usuais de pecado-e-redenção. A coisa me parece muito mais simples: temos luz-entendimento suficiente para, querendo, reconhecer como são as coisas, "sem engano" (ou pelo menos para ir fazendo nosso caminho gradual na direção disso), mas podemos ignorar, não acolher a luz que temos em potência. Escolher a inconsciência, ou a consciência enganosa. Não consigo imaginar Deus querendo nos fritar por isso. Mas por outro lado é grande a chance de que a consciência enganosa que escolhemos nos leve a tentar passar em portas apenas pintadas na parede.

- Entendo...

III

- E agora o principal: "e o lógos se fez carne e acampou em nós".

- Acampou em nós?? Que papo é esse? Não é "e habitou entre nós"?

- Uma das tiradas mais brilhantes da Bíblia inteira é jogada fora com esse pobre verbo "habitar". Está escrito que o lógos se estabeleceu com a sua tenda - e você sabe o que isso significa dentro do contexto cultural judaico, não? Aliás, é só nessa fala que a herança judaica entra em cena, até aqui estávamos na mais grega das discussões... Enfim, a tenda...

- Sei, a vida dos judeus como um povo organizado, com sua própria lei, começou no tempo em que viveram em tendas, no melhor estilo acampamento dos sem-terra, saindo do Egito e ocupando pouco a pouco a terra de Canaã...

- Sim, mas no meio das outras havia uma tenda especial: a que abrigaria o próprio Deus de Israel, em duas formas...

- ?

- Em forma de pura força, com o suporte físico da Arca da Aliança, e na forma do discurso, da fala dessa força, traduzido em palavras humanas por Moisés e registrado por escrito em tábuas de pedra: A Lei. Por uns 200 anos esse conjunto Arca-Tábuas viveu numa tenda, e com ele a consciência do povo de Israel - tanto consciência de ser um povo como consciência no sentido de código do que seja certo e errado.

... E agora esse João se atreve a dizer: "e a Fala Divina se fez carne", não mais pedra, "e fez sua tenda em nós".

- Não é "entre nós", "no meio de nós"?

- A palavra grega permite as duas leituras, "em" e "entre", e desconfio que as duas leituras estão certas ao mesmo tempo - tanto quanto somos ao mesmo tempo seres individuais e sociais.

... Enfim: apesar de João dizer "a vida era a luz dos seres humanos" (talvez não por acaso com o verbo no passado), parece que há muito se havia estabelecido um dualismo, uma certa oposição, entre palavra-luz e carne-vida - e com isso um divórcio entre pensamento e ação.

... E antes que você me diga que isso é apenas a forma grega de ver o mundo, vou lhe dizer onde essa dualidade aparece de forma particularmente intensa e comovente: na concepção de ser humano dos guaranis.

... Na concepção guarani a alma-fala que habita em nós é responsável não só pela fala como também pela nossa posição vertical e pelo nosso comportamento ético-social - mas além dela também nos habita uma alma-animal. O rompimento de certos preceitos leva a alma-palavra a se afastar e nos deixa vivos porém animalizados: perdendo o eixo vertical, grunhindo ou urrando, incapazes de participar da comunidade humana. Um desses preceitos é o de jamais comer o caça no mato, e sim levá-la sempre para a partilha, a comunhão. Se traio a comunidade humana, sua virtude me abandona: é ilusão que alguém possa viver só para si e permanecer humano, pois ninguém é humano só por si.

- Que fantástico... Tem até Vygotsky e Luria aí no meio...

- Você desculpe que hoje não dá tempo de a gente escarafunchar em detalhe as mil possíveis relações... Agora só quero focar em que João me parece falar de um projeto de radical transgressão dessa dualidade: fala das intenções da Palavra-Consciência de ocupar em nós o potencial que existe para isso nos próprios processos biológicos; ultrapassar o estado "mente sem corpo comanda processo biológico cego", mirando para um ideal em que a corporalidade inteira participe dos processos da consciência, e que com isso também a consciência seja mais e mais una com a capacidade de agir.

... E por isso se faz carne - carne mesmo, músculo... - pois não existe ação nossa que atinja o mundo se não com a participação de músculos, mesmo que sejam os dos braços quando digito este texto, a língua (que é músculo) quando falo, os dos olhos quando demonstramos interesse por alguém.

... O que temos é, enfim, um ideal de integridade - mas, além de integridade, também de autonomia: é em cada um de nós que o Discurso-Responsável-pelo­-Mundo quer estabelecer sua tenda irradiadora de consciência; é na carne-ação de cada um de nós que ele quer se tornar.

- E você com isso dispensou Jesus Cristo?

- De jeito nenhum. Só que eu tenho certeza de que hoje, depois de tanta coisa terrível que foi feita em associação com esses dois nomes humanos que você acaba de pronunciar, esse Jesus - ou a Palavra que atuou na forma dele - não faz questão nenhuma de ser mencionada por esses nomes. Essa Palavra prefere ser pronunciada na forma de ações.

- Mas, escuta aqui, você acha que Jesus era mesmo "encarnação da Palavra"? Isso não é uma crença que ainda por cima desfaz dos seguidores de outras religiões?

- Mas se eu estou dizendo que todo ser humano pode ser, por que Jesus não poderia?

- !

- Hahahaha, essa virada do laço pelo avesso você não esperava, né?

... Mas entendo que, por causa dos horrores que eu já mencionei, seja justificada uma resistência ao nome histórico dele, justamente por parte das pessoas mais consciente e mais morais. Por isso falei de chegar a uma compreensão que vincula diretamente a Palavra-Consciência e a Ação, sem passar pelas palavras-nomes.

... Mas nem por isso precisamos excluir totalmente o personagem histórico das nossas considerações... Segundo o mesmo João, esse Jesus teria dito "aquele que põe fé em mim (e aqui eu entendo: põe fé nisto que eu estou sendo) fará as mesmas coisas que eu, e ainda maiores". Está claro que ele não teve nenhuma pretensão de exclusividade, como quiseram entender depois. E aí acho que em reconhecimento a isso o mínimo que a gente poderia fazer é também não excluir...

- Mas essa compreensão dele é tão rara... Será que você não está completamente sozinho nisso?

- Não sei se isso importa muito... mas, em todo caso, totalmente sozinho eu não estou: dê uma lida por exemplo em O Grande Inquisidor, uma sub-história inserida dentro do romance Os Irmãos Karamázov: minha impressão é que Dostoiévski estava enxergando precisamente a mesma coisa, sem tirar nem pôr.

- E o Natal, monge Josefus? O que é que a gente faz dele?

- Olha, eu sou da opinião que você deixe cada um fazer o que quiser... Você sabe que o Lógos não está nem aí para que celebrem sua encarnação numa festa desse tipo; que a verdadeira celebração é realizar de novo essa encarnação o tempo todo - atualizá-la, como dizem os estudiosos de religiões e mitos, só que aqui não apenas simbolicamente como as religiões costumam fazer, e sim em ações de alcance real.

... Eu diria que estamos celebrando desse modo cada vez que conseguimos realizar as seguintes situações ou qualidades:

     Razão que liberta
     Amor qu
e não deixa que a liberdade se torne

          abandono e
falta de conexão
     encarnados em conjunto em Ação real neste mundo.

... Ou, um pouco mais simples

     Razão que liberta,
     Amor que une em liberdade,
     encarnados em Ação real neste mundo.

... Ou ainda:

     Autonomia (cri)ativa,
     que assume responsabilidades pelo mundo
           voluntariamente, por amor
     respeitando a liberdade alheia,
     não no passado, mas em cada um de nós, agora.

... Mas vou lhe dizer uma última coisa: se você também quiser falar disso na época de Natal, por que não? Com certeza pode ser um enriquecimento desse momento...

... desde que você invente um jeito de não fazer o pessoal ter que passar por isso pra chegar na ceia e na farra, senão a humanidade vai pegar justo ódio e repulsa por aquilo que seria a sua evolução. Definitivamente, discurso que se faz chato não pode ser o mesmo de que eu estava falando!!

- Pode deixar, monge Josefus!

- Escuta meu amigo, que tal a gente atacar aquela comidinha ali, abrir um vinhozinho, e você me chamar de Zé?
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São Paulo 25.12.2008

15 dezembro 2008

caso Caroline: 3 apelos de peso com PETIÇÃO PARA ASSINAR

Estamos nessa campanha desde 04/12. Caroline Piveta Mota continua presa, agora há > 50 dias.
Vão aqui os apelos de MARCELO TAS, de VITOR ANGELO (petição para assinar) e do MINISTRO DA CULTURA.
Não é tolerável viver em uma sociedade onde a aparência dos patrimônios conte mais que a vida de pessoas!

Bienal do Vazio e da Vergonha
 
 
Este blog apóia integral e firmemente o movimento contra a absurda prisão da pichadora Caroline Piveta Mota. Não bastasse o vexame que é a presente Bienal, fraquíssima de arte e espírito, ainda vai passar para a história como a mostra que convocou a sociedade a se manifestar no seu "vazio" e a puniu por isso. Censura e repressão grosseiras!

Convido os leitores desse blog a ler abaixo o manifesto e assinar a petição.
Inacreditável que em pleno século 21 ainda tenhamos que gritar: Abaixo a censura, abaixo a repressão!

Petição criada pelo artista/jornalista Vitor Angelo
endereço original http://www.abaixoassinado.org/abaixoassinados/3309

Destinatário: FUNDAÇÃO DA BIENAL DE SÃO PAULO E MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

No dia da abertura da 28ª Bienal de Artes de São Paulo, 40 pichadores entraram no Pavilhão e "atacaram" com seu design gráfico todo particular o segundo andar o prédio, o local que estava o chamado "vazio" proposto pela curadoria que consistia de paredes e pilastras brancas. Na ocasião, a pichadora Caroline Piveta Mota foi a única detida sob a alegação de depredar o patrimônio público. Acusada de se associar a "milicianos" para "destruir as dependências do prédio", a jovem continua presa.

O que nós, agentes culturais, estranhamos é que existe um paradoxo nesse caso, pois se trata de patrimônio público, mas também de uma mostra de arte contemporânea, local propício para esse tipo de manifestação desde o começo do século 20. Como escreveu o professor e artista Artur Matuck: "As paredes foram pichadas e repintadas e a mostra não foi prejudicada. Independente da discussao estética, se a pichaçao é ou não arte, se se justifica ou não, a atuação deste grupo ao invadir o prédio da Bienal com um grupo de pichadores, foi também um ato expressivo, foi inequivocamente uma manifestaçao cultural. [...] Uma discussão ampla e bem informada sobre o fenômeno cultural da pichaçao é relevante desde que na medida em que não é validado enquanto expressão artistica pode ser considerado como vandalismo e justificar repressão". Repressão essa que faz Caroline estar presa até hoje e ainda pegar uma pena de 3 anos.

Por isso pedimos: LIBERTEM A PICHADORA CAROLINE PIVETA DA MOTA!
 
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Complementamos repetindo a extremamene lúcida e bem fundamentada
NOTA DO MINISTRO DA CULTURA SOBRE O CASO CAROLINE PIVETA
 
O Ministério da Cultura vem a público a fim de que se busque uma saída na esfera cultural para o impasse decorrente do ato e da prisão da jovem Caroline Piveta da Mota, de 23 anos de idade. Ela integrava o grupo que pintou com tinta spray o edifício da Bienal de São Paulo, no local onde os curadores da 28 mostra estabeleceram um espaço vazio de interação com o público. Cremos ser legítima a preocupação, manifestada por muitos artistas e agentes culturais do país, com os desdobramentos que podem criminalizar uma atitude que tem características culturais, muito embora não concordemos com a agressão simbólica proposta e nem tampouco com os textos divulgados como de autoria do grupo.
 
Temos buscado o diálogo constante com grupos jovens dos centros urbanos e das periferias das grandes cidades por acreditar que esta é a forma mais eficaz e duradoura de combater os impulsos violentos que são gerados em meio a desagregação reinante em tais ambientes de fragilidade sociocultural nos quais vivem estes indivíduos. Contudo, cremos que a agressividade simbólica ainda aparece como "alternativa" , de forma ilusória, a estes jovens submetidos a um cotidiano de violência, e passa a ser a "compensação cultural" por vezes a seu alcance para fugir do crime ou da marginalidade de fato. Devemos recordar que, desde muito, essas populações tem suas formas de expressão e de linguagem enquadradas como atos de violência e desrespeito social, como foram as rodas de capoeira no passado, os bailes funks nos dias correntes. O que não podemos esquecer é que a cultura toma caminhos que fogem do padrão estabelecido para expressar conteúdos latentes nas formações sociais emergentes. Não desconhecemos que estas situações podem, vez ou outra, superar o âmbito criativo, mas devemos ainda lembrar que isso ocorre também pela falta de comunicação social e pela pouca acessibilidade destes cidadãos aos bens diversificados de nossa cultura e de nossa arte. Temos certeza que tais conflitos precisam ser trabalhados pelas políticas públicas e pelas instituições de modo a evitar uma maior desagregação do tecido de nossa sociedade.
 
Acreditamos que os mais de 40 dias de prisão guardam desproporção com o ato da jovem, porque tal medida pode gerar uma intensificação dos conflitos que buscamos combater, uma vez que se tornaram um problema real. O ato dos jovens, por mais que discordemos dele, não deve ser criminalizado como se ocorresse uma pixação e depredação do patrimônio cultural ali protegido por lei. Ele aconteceu num espaço específico em que era permitido a todo visitante exercer seu livre e vivo contato com o lugar simbólico da Bienal, uma mostra de arte na qual, segundo a imprensa, muitos outros grupos e indivíduos manifestaram- se da mesma forma, protestando contra ou aderindo ao conceito curatorial, com ações diferentes. O grupo de jovens reivindica o estatuto artístico e cultural ao seu ato. Quem deve julgar e avaliar tal mérito são as instituições culturais, os críticos e historiadores da arte, através dos recursos da reflexão e do debate público. Cremos que o papel do estado é garantir esse espaço público de discussão e apreciação dos valores contemporâneos, evitando que o poder público decida em favor de nenhuma parte e em prejuízo ao todo que forma a cultura. Peço encarecidamente que as instituições culturais e os poderes públicos do país cuidem para que possa ser mantido o ambiente democrático de diálogo e o direito de todos à diversidade de suas manifestações culturais.
 
Juca Ferreira
Ministro da Cultura
 
 
Redistribuído por
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Ralf Rickli • arte em idéias, palavras & educação
http://ralf.r.tropis.org • (11) 8552-4506

COMPLEMENTO: Caroline Pivetta, o Direito, as perspectivas de revolução e o pluralismo...

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À mensagem/postagem anterior, Calu Baroncelli respondeu:
Pois é, Ralf, a fala do Ministro é muito bem embasada e a perplexidade do Serra nem me assusta, pois vem de quem vem. Afinal, e eis o que vejo aí um grande problema: infelizmente o judiciário não entende de cultura, não é?... o que fazer nessas horas? Enxergar somente que a lei deve ser cumprida, sem o entendimento da questão social e cultural que há por trás, é e sempre será, uma tremenda burrice.
Por isso não tenho esperança nenhuma na nossa Justiça, sempre injusta.
Beijos
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E a isso respondo eu...
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E o pior, Calu, é que essa burrice da justiça para a dimensão real das coisas, antropológica, viva, é GERAL, não é só no Brasil. Verdade que é pior em todos os países onde predomina a herança do direito romano, formalista, enquanto o direito de origem germânica, anglo-saxônica, é um pouco mais baseado no costume (jurisprudência)  e na consciência dos juízes.
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O que eu sinto é que estamos chegando no limite de todas as instituições como conhecemos. Que é forçoso que venha algo como uma fase revolucionária pela frente - mas as concepções marxistas usuais não dão conta nem de longe da profundidade que isso quer e precisa ter.
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E o triste é que se não houver um volume suficiente de gente que tenha conseguido formular conscientemente quais devem ser os rumos dessas revoluções, haverá apenas desagregação, caos crescente, e a possibilidade de formas ainda mais retrógradas e autoritárias virem a se estabelecer (do mesmo modo como o nazismo e o fascismo conseguiram se estabeler depois da fase de fulgurante liberdade e criatividade que foram os anos 20 do século XX).
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Minha "doutrina" do Pluralismo Radical almeja nada menos do que isso, ser a diretriz fundamental para que uma nova fase revolucionária posse dar bons resultados, e não levar a retrocessos... Mas ai... que sou apenas mais uma pulguinha anônima, e esse pequeno critério para que a zoeira geral seja produtiva, provavelmente nem ele mesmo conseguirá ser ouvido no meio da zoeira que já está aí... 
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(Zé Ralf)
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Fw: Caroline Pivetta - manifestação do Ministro da Cultura

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Excelente contribuição, Calu!  E extremamente lúcida a fala do Ministro da Cultura. Parabéns a ele!! Revela entendimento antropológico.
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De resto, essa questão toda tem a ver com o risco de policialização e burocratização da vida, que pode tornar um inferno a vida mesmo nos lugares aparentemente democráticos - haja visto o tratamento desumano que os brasileiros vem recebendo no aeroporto de Madrid e que está perfeitamente de acordo com as leis... e por outro lado as atuais manifestações na Grécia, por uma insatisfação difusa que se torna cada vez mais geral na União Européia. Reações talvez pouco racionais, "selvagens", porém justificadas.
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Não sei se você viu as notícias de que o Serra teria ficado "perplexo" com a intervenção do ministro, porque isso seria uma pura questão judiciária, e nenhum deles do executivo teria nada a ver com isso. A divisão de responsabilidades é uma faca de dois gumes: por um lado ajuda a evitar o arbítrio dos governantes, por outro pulveriza as responsabilidades e faz a sociedade virar um jogo anônimo, onde não existe nenhum ROSTO a quem se dirigir que responda pelas coisas. Tanto no mundo público como no provado, sabemos que as ouvidorias costumam ser meras farças para aliviar a pressão do descontentamento social.
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Posso não saber onde está a solução, mas uma coisa sei: NÃO É POR AÍ... 
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Abraço forte,
Ralf
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----- Original Message -----
Sent: Monday, December 15, 2008 10:16 AM
Subject: Caroline Pivetta - manifestação do Ministro da Cultura

Olá pessoal
segue uma manifestação do Ministro da Cultura em relação ao caso Caroline Piveta, tão debatido aqui neste grupo...
abraços
Calu
 
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O Ministério da Cultura vem a público a fim de que se busque uma saída na esfera cultural para o impasse decorrente do ato e da prisão da jovem Caroline Piveta da Mota, de 23 anos de idade. Ela integrava o grupo que pintou com tinta spray o edifício da Bienal de São Paulo, no local onde os curadores da 28 mostra estabeleceram um espaço vazio de interação com o público. Cremos ser legítima a preocupação, manifestada por muitos artistas e agentes culturais do país, com os desdobramentos que podem criminalizar uma atitude que tem características culturais, muito embora não concordemos com a agressão simbólica proposta e nem tampouco com os textos divulgados como de autoria do grupo.
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Temos buscado o diálogo constante com grupos jovens dos centros urbanos e das periferias das grandes cidades por acreditar que esta é a forma mais eficaz e duradoura de combater os impulsos violentos que são gerados em meio a desagregação reinante em tais ambientes de fragilidade sociocultural nos quais vivem estes indivíduos. Contudo, cremos que a agressividade simbólica ainda aparece como "alternativa" , de forma ilusória, a estes jovens submetidos a um cotidiano de violência, e passa a ser a "compensação cultural" por vezes a seu alcance para fugir do crime ou da marginalidade de fato. Devemos recordar que, desde muito, essas populações tem suas formas de expressão e de linguagem enquadradas como atos de violência e desrespeito social, como foram as rodas de capoeira no passado, os bailes funks nos dias correntes. O que não podemos esquecer é que a cultura toma caminhos que fogem do padrão estabelecido para expressar conteúdos latentes nas formações sociais emergentes. Não desconhecemos que estas situações podem, vez ou outra, superar o âmbito criativo, mas devemos ainda lembrar que isso ocorre também pela falta de comunicação social e pela pouca acessibilidade destes cidadãos aos bens diversificados de nossa cultura e de nossa arte. Temos certeza que tais conflitos precisam ser trabalhados pelas políticas públicas e pelas instituições de modo a evitar uma maior desagregação do tecido de nossa sociedade.
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Acreditamos que os mais de 40 dias de prisão guardam desproporção com o ato da jovem, porque tal medida pode gerar uma intensificação dos conflitos que buscamos combater, uma vez que se tornaram um problema real. O ato dos jovens, por mais que discordemos dele, não deve ser criminalizado como se ocorresse uma pixação e depredação do patrimônio cultural ali protegido por lei. Ele aconteceu num espaço específico em que era permitido a todo visitante exercer seu livre e vivo contato com o lugar simbólico da Bienal, uma mostra de arte na qual, segundo a imprensa, muitos outros grupos e indivíduos manifestaram- se da mesma forma, protestando contra ou aderindo ao conceito curatorial, com ações diferentes. O grupo de jovens reivindica o estatuto artístico e cultural ao seu ato. Quem deve julgar e avaliar tal mérito são as instituições culturais, os críticos e historiadores da arte, através dos recursos da reflexão e do debate público. Cremos que o papel do estado é garantir esse espaço público de discussão e apreciação dos valores contemporâneos, evitando que o poder público decida em favor de nenhuma parte e em prejuízo ao todo que forma a cultura. Peço encarecidamente que as instituições culturais e os poderes públicos do país cuidem para que possa ser mantido o ambiente democrático de diálogo e o direito de todos à diversidade de suas manifestações culturais.
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 Juca Ferreira
Ministro da Cultura


13 dezembro 2008

a fim de fazer fama pra deitar na cama?

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Para aqueles de nós que pensam que ser famoso é poder deitar na cama
e/ou que se realiza qualquer coisa em arte sem dedicação disciplinada...

Madonna ensaiou por 653 horas para turnê "Sticky & Sweet"

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Ralf Rickli • arte em idéias, palavras & educação
http://ralf.r.tropis.org • (11) 8552-4506
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10 dezembro 2008

sacada sobre A SAÍDA DAS NOSSAS DIFICULDADES - compartilhando

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Amigos - permitam-me compartilhar uma frase que acabo de conhecer.  Depois de lida se mostra ÓBVIA, e de tão simples pode parecer coisa de mera auto-ajuda barata. Mas não é MERO nada não - na verdade é uma sacada pra lá de séria...
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Sair de nossas dificuldades envolve necessariamente modificar em profundidade nossa relação conosco mesmos e com todo o nosso passado.
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Alejandro Jodorowsky, cineasta, dramaturgo, quadrinhista e psicólogo chileno
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Original: Salir de nuestras dificultades implica modificar en profundidad nuestra relación con nosotros mismos y con todo nuestro pasado.
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Abraços!
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Ralf Rickli • arte em idéias, palavras & educação
http://ralf.r.tropis.org • (11) 8552-4506
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muita terra pra pouco índio? CONFIRA!

Com freqüência o pessoal contrário às reservas indígenas dizem que é muita terra pra pouca gente. Agora vejam só os seguintes números que nunca tinham me mostrado antes. (Quero dizer: às vezes usamos tantas palavras e argumentos apaixonados para defender uma causa, que acabamos não deixando o justo destaque para dados fundamentais que falam por si!)
 
 
Diferentes levantamentos calculam em 19 mil o números de índios na reserva [Raposa Serra do Sol]. Tomando-se como base os 1,7 milhões de hectares previstos na demarcação, cada índio teria em torno de 90 hectares, em média. Os seis donos de terras [os arrozeiros não índios] controlam, em média, 2,5 mil hectares cada.
 
A DECISÃO PODE SAIR HOJE (quarta 10/12/2008). E se não podemos fazer mais, quem sabe pelo menos um pouco de pensamento positivo, não??
 
Abraços!
 
.........................................................
Ralf Rickli • arte em idéias, palavras & educação
http://ralf.r.tropis.org • (11) 8552-4506

09 dezembro 2008

esclarecimento: SOBRE A BELEZA DE CERTAS FEIÚRAS E A FEIÚRA DE CERTAS BELEZAS

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Tendo acabado de postar mais uma reportagem do uol sobre a prisão de Caroline Piveta, quero esclarecer que de modo geral, pelo aspecto estético, não gosto de pichação. Costumo achar paredes pichadas uma coisa feia, deprimente. Mas ao mesmo tempo uma coisa útil, necessária e efetivamente saudável, justamente na medida em que é incômoda: ela não nos deixa ficar iludidos de que as coisas estão bem na sociedade quando não estão.
 
Enquanto acharmos que qualquer 'patrimônio' pode ser mais importante que qualquer vida humana, mereceremos ser castigados pelas pichações.
 
Que haja multidões de jovens sem espaço (físico e espiritual) para seu desenvolvimento humano integral, isso é uma coisa muitíssimo mais grave que as paredes e muros estarem enfeiados. Paredes e muros que raramente têm algo de efetivamente público: ou são dessa empresa burocrática pseudo-pública que se chama Estado, ou são de pessoas físicas ou jurídicas reconhecidamente privadas, ou melhor: PRIVANTES.
 
Pois justamente elas - paredes, muros e grades - são tanto símbolos quanto efetivos instrumentos do ato da apropriação por alguns do espaço que era de todos. E não é por acaso que os jovens das camadas sociais majoritárias que são via-de-regra excluídas dos benefícios concentrados atrás dessas paredes e muros sentem mesmo que inconscientemente o impulso de sair deixando neles marcas tribais, ancestrais, antropológicas: "Não pensem que deixamos de existir! Suas lindas paredes e muros enfeiam a nossa existência - e então nós os enfeiaremos em retorno com nossas assinaturas, com lembretes de que ainda existimos". 
 
A mais feia marca de vida humana livre ainda é mais bela - eticamente mais bela - que o mais esteticamente projetado instrumento de exclusão - isto é: de privatização de confortos cuja existência sequer seria possível sem a existência de classes exploradas - ou seja: de pessoas que nem mesmo podem dar atenção aos filhos porque para sobreviverem têm o tempo todo que estar preparando a mesa das classes privilegiadas, já que esse é o único modo que têm de se alimentarem: comerem dos farelos que caem da opulenta mesa que servem aos seus opressores.
 
Filhos sem atenção parental nem possibilidade de atenção parental, sem creche nem escola decente, sem nem amostra do que seja beleza em suas próprias vidas... enfeiem SIM os feios muros feitos belos por artistas vendidos (arquitetos) para disfarçar a bárbara feiúra de todos os atos das classes que vivem de expropriar humanidade de outros seres humanos.
 
PATRIMÔNIO, conceito criado pelos violentíssimos e opressores romanos, é sempre crime contra a humanidade. Nojenta que seja, a pichação é sempre protesto político, mesmo se feita com total inconsciência. Vingança do homem tribal contra um "desenvolvimento" imposto por poucos em lugar do único que seria aceitável: sonhado e projetado desde suas bases por todos e para todos.
 
(Tudo o que está dito acima podia ser mais amplamente demonstrado e defendido... mas por enquanto é o que dá. Que fique pelo menos registrado. Abraços ............... Zé Ralf)
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mais sobre Caroline Piveta - LIBERDADE JÁ !!!

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09/12/2008 - 07h01

Mãe faz maratona judicial para libertar a pichadora da Bienal

Rodrigo Bertolotto
Do UOL Notícias
Em São Paulo
Rosemari Pivetta da Mota peregrina pelos corredores da Justiça desde que deixou no dia 28 de novembro a suburbana Alvorada, na Grande Porto Alegre, e viajou para São Paulo. Já passou por tribunal, penitenciária, escritório de advocacia, defensoria pública e até prédio do Exército. Tudo para tentar libertar sua filha, Caroline, detida por pichar o prédio da Bienal de São Paulo.

CENAS DA VIDA

  • Arquivo da família

    Rosemari (esq.) posa com a filha em foto feita em agosto último

  • Arquivo da família

    Na casa em Alvorada (RS), Caroline posa ao lado de girassol

  • Arquivo da família

    Retrato de Caroline quando tinha um ano, segurando boneca

Caroline foi presa no primeiro dia da tradicional exposição de artes, que se encerrou no último sábado. Vários artistas já se manifestaram pela libertação da garota, e pichadores fizeram grafites no centro paulistano e até na fachada da casa do ex-prefeito Celso Pitta, que está solto graças a um habeas corpus do TJ-SP (Tribunal de Justiça), após ter tido prisão decretada por não pagar pensão alimentícia a ex-mulher, Nicéa.

É justamente um habeas corpus que Rosemari busca para sua filha voltar para a rua após 45 dias atrás das grades, a maioria deles na cela 265 da Penitenciária Feminina Sant´Ana, na zona norte da cidade.

Há dez dias em São Paulo, a mãe só conseguiu ver a filha uma vez. "Eu me emocionei muito, e ela também. Nossa relação sempre foi de muito contato físico e acho que ficamos abraçadas muitos minutos, chorando, depois olhar nos olhos dela, acariciar seu rosto para só então falarmos", contou para a reportagem do UOL sobre sua visita da última quinta-feira.

Caroline faz 24 anos na próxima sexta-feira, e a mãe já imagina comemorá-los com a filha respondendo em liberdade. "Sou extremamente otimista. Meu sonho agora é passar o aniversário com ela", afirma.

Com o lema "Em Contato Vivo", a Bienal de Artes de São Paulo de 2008 foi marcada pelo andar vazio, lugar de intervenções que causaram polêmicas. Das oficiais, chamou a atenção o performer Maurício Ianês, que ficou nu para receber doações dos visitantes em uma ação intitulada "A Bondade de Estranhos". Das extra-oficiais, a invasão do grupo de 40 pichadores que grafitaram as paredes brancas do local acabou com corre-corre, confronto de seguranças e manifestantes e Caroline, como única detida - Rafael Martins foi preso já na delegacia quando foi levar os documentos de Caroline e acabou reconhecido pelos presentes, ficando oito dias confinado.

É esperando a bondade dos outros que Rosemari transita pelos corredores jurídicos. "Eu me locomovo de metrô e ônibus, sempre com um caderno à mão para anotar dados, indicações, telefones. Apesar de infrutíferas idas-e-vindas, fui atendida com muita presteza, educação", relata sobre uma burocracia cordial, mas que não resolve seu problema. Por esse mesmo motivo que nesta terça-feira ela deve trocar de advogado.

A organização da Bienal soltou uma declaração oficial no dia seguinte do incidente classificando de atitude dos jovens de "autoritária" - essa palavra deriva de autoridade, que, no caso, está do lado oficial, com a Bienal prestando queixa, a polícia prendendo e da Justiça mantendo detida uma garota cujo crime foi pintar uma parede branca dentro de uma mostra de arte. De lá para cá, os curadores e responsáveis pela Bienal não quiseram mais abordar o tema.

Rosemari compreende a situação em que a filha se meteu e se surpreende quando a ajuda vem do lado que menos espera. "Amor de mãe é incondicional. Não significa que uma mãe queira isentar seu filho de suas responsabilidades, mas não peça a uma para deixar que seu filho se vire. Mas eu a vi bem fisicamente na penitenciária, todos são atenciosos e sorridentes com ela, pois ela sabe cativar", lembra.

Trabalhando como artesã, Rosemari criou sozinha a filha. As duas trocaram o sul por Diadema, na Grande São Paulo, onde Caroline viveu de um ano de idade até os 16. Uma nova mudança as levou para Alvorada, município limítrofe com a capital gaúcha. Com a maioridade, Caroline quis voltar a conviver com os amigos que deixara em São Paulo. Em abril último, voltou para a região e abraçou a causa da pichação, indo parar na delegacia várias vezes. Em uma delas, foi por grafitar um prédio pertencente ao Exército.

No ataque (jargão do universo do "pixo") feito na Bienal , Caroline adotou uma postura militante e, enquanto a maioria escapava (uns quebraram até um vidro do prédio na debandada), ela gritava "eu sou pichadora" e "viva a pichação" sendo levado à viatura policial.

Espírita, Rosemari encontra na religião forças para tirá-la da cadeia. "Quando sabemos que Deus nunca dá um fardo além de nossas forças, que nada é por acaso, que ninguém pode sofrer as nossas dores mas que podem nos ajudar a suportá-las, nossas forças centuplicam. Quando saí do Rio Grande do Sul, saí sabendo que não seria fácil, mas não imaginava encontrar o que encontrei."

O irônico é que Caroline tem a palavra "liberdade" tatuada no peito, mas ela não experimentou a liberdade de expressão na Bienal e hoje vivencia a total falta dela na penitenciária.
 

Comentário de GUNNAR VARGAS à matéria da semana passada, deixado no UOL em 04.12.2008:
 
Fiquei completamente tonto ao ler os comentários desta notícia com posições completamente equivocadas em diversos aspectos. Arte é antagônica ao conservadorismo. O andar vazio chegou aos meus ouvidos como um protesto do próprio curador da exposição pela falta de exposições na Bienal. A atitude da grafiteira foi uma continuidade ao protesto do curador. Quais são os mecanismos para que ela seja considerada ou não arte? Os circuitos e panelas artísticas! Existem muitos artistas que não são reconhecidos e nem serão porque não participam dessas panelas. Os grafiteiros do Brasil são extremamente criativos. Muitos são contratados para grafitar no exterior e muito bem remunerados. Não estou aqui defendendo que a pixação de Caroline seja arte, pois não a vi (nem deu tempo), apenas entendendo sua atitude como agregadora à exposição e às intenções do curador. A prisão, é uma coisa muito séria. Quem dos senhores já foi preso? Sabe o que é estar preso? Liberdade à Caroline Piveta JÁ!
 
Comentário de RALF RICKLI deixado no UOL em 04.12.2008:
É compreensível que pessoas sem nenhuma informação sobre o que é o mundo da arte desde o século XX deixem aqui mensagens dizendo que que Caroline da Mota deve permanecer presa porque "pixação não é arte". Inadmissível a direção da Bienal que conhece um Beuyis, um Duchamp, um Andy Warhol, um Basquiat... Inadmissível essa mesma classe de "senhores da arte" que há poucos anos louvavam a "corajosa transgressão" (quer dizer, a FAZEÇÃO DE GÊNERO) da filhinha de papai Jac Leirner com suas instalações de objetos furtados de aviões. (Alguém me replicou que ela PEDIA os objetos das companhias aéreas; se foi assim é pior porque enganou a opinião pública na ocasião, afirmando claramente que os roubava). O "crime" de Caroline Mota não é ter pixado uma parede QUE EXISTE PARA MANIFESTAÇÕES: é não ter família rica e/ou influente, nem pertencer à comunidade que hoje dita as regras do que seja "arte" com o único fim de manter para si e para os seus, sob esse nome, um mercado encantadoramente lucrativo.
 
 

04 dezembro 2008

Re: mulher presa há 40 dias por intevenção na Bienal / COMENTÁRIOS

Oi Gunnar - foi no UOL que vc deixou comentário? Dei uma olhada lá e não vi... Às vezes eles "moderam" e não colocam...
 
Da minha parte acabo de deixar lá o comentário seguinte:
 
É compreensível que pessoas sem nenhuma informação sobre o que é o mundo da arte desde o século XX deixem aqui mensagens dizendo que que Caroline da Mota deve permanecer presa porque "pixação não é arte". Inadmissível a direção da Bienal que conhece um Beuyis, um Duchamp, um Andy Warhol, um Basquiat... Inadmissível essa mesma classe de "senhores da arte" que há poucos anos louvavam a "corajosa transgressão" (quer dizer, a FAZEÇÃO DE GÊNERO) da filhinha de papai Jac Leirner com suas instalações de objetos furtados de aviões. (Alguém me replicou que ela PEDIA os objetos das companhias aéreas; se foi assim é pior porque enganou a opinião pública na ocasião, afirmando claramente que os roubava). O "crime" de Caroline Mota não é ter pixado uma parede QUE EXISTE PARA MANIFESTAÇÕES: é não ter família rica e/ou influente, nem pertencer à comunidade que hoje dita as regras do que seja "arte" com o único fim de manter para si e para os seus, sob esse nome, um mercado encantadoramente lucrativo.
 
Abraços a tod@s,
Ralf
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Ralf Rickli • arte em idéias, palavras & educação
http://ralf.r.tropis.org • (11) 8552-4506
----- Original Message -----
Sent: Thursday, December 04, 2008 12:50 PM
Subject: Re: mulher presa há 40 dias por 'INTERVENÇÃO' verdadeira na Bienal !!!

deixei um recado lá rsrs

2008/12/4 Ralf Rickli / Tropis <rrtrop@gmail.com>
GENTE, ISTO É INACREDITÁVEL!!! 
 
QUANTA HIPOCRISIA
DA DONA BURGUESIA!!     (Ralf)
 
 

04/12/2008 - 07h01

Artistas cobram iniciativa da Bienal para liberar pichadora presa há 40 dias

Rodrigo Bertolotto
Do UOL Notícias
Em São Paulo (SP)
Caroline Piveta da Mota, 23, entrou no prédio da Bienal de São Paulo, pintou com spray uma parede e está presa há 40 dias. Levada ao 36º Distrito Policial , na rua Tutóia, três dias depois foi aprisionada na Penitenciária Feminina Sant´Ana, no Carandiru.

PICHAÇÃO E DETENÇÃO

  • Talita Virginia/Folha Imagem

    Segurança da Bienal avista Caroline escrevendo o nome...

  • Talita Virginia/Folha Imagem

    ...da gangue Sustos nas paredes do segundo andar (planta vazia) ...

  • Talita Virginia/Folha Imagem

    ...e acaba detida por PM que foi chamado pela organização

As últimas palavras a caminho da viatura foram: "Eu sou pichadora" e "Viva a pichação". Isso aconteceu no primeiro dia do evento, que termina no próximo sábado marcado por esse caso policial.

A ação no segundo andar do prédio (a "planta do vazio") foi classificada como "terrorismo poético" e "intervenção artística" por seus defensores e de "vandalismo" e "atitude autoritária" pela declaração oficial de uma Bienal que tinha como lema "Em Contato Vivo" e prometia refletir sobre a arte contemporânea e o circuito artístico.

"Isso é uma hipocrisia absurda. Quem devia ser preso são os organizadores. O andar vazio era um convite à manifestação, à contravenção. O mínimo que a Bienal pode fazer é colocar seu advogado para liberar a moça", afirmou o artista José Roberto Aguilar.

Fora a declaração em 27 de outubro, a curadoria da mostra não quis se manifestar sobre o assunto. Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen foram procurados pela reportagem do UOL desde a semana passada, sempre alegando por meio da assessoria de imprensa que não tinham espaço em suas agendas.

Quem falou foi Rafael Vieira Camargo Martins, 26, o amigo de Caroline que foi preso ao levar os documentos da garota no DP. Ele foi reconhecido pelos presentes na delegacia e acabou detido por oito dias. "Fui à Bienal porque vi as mensagens pela Internet falando da invasão. Mas não pichei nada. Fui só ver. Eles não conseguiram provar e me liberaram", contou em conversa telefônica.

Taxista na região do Ipiranga, ele afirmou que perdeu dias de trabalho e a auto-estima com a prisão. "Com que cara eu fico diante de meus passageiros, sabendo que eu estive na cadeia? Os policiais me zoaram, mas os companheiros de cela me ajudaram", conta Rafael, que participará nos próximos dias de uma manifestação pedindo a libertação da amiga.

Ele deve visitar a amiga na penitenciária no próximo domingo. Ambos estão sendo processados por destruição do patrimônio público e podem pegar uma pena de três anos de reclusão. Aponta-se envolvimento em outras duas ações anteriores, em junho no Centro Universitário de Belas Artes (Vila Mariana) e na galeria Choque Cultural (Vila Madalena). As três iniciativas teriam como mentor Rafael Guedes Augustaitiz, conhecido no meio como Pixobomb, e foram registradas em vídeos ou fotos.

Dê a sua opinião

A ação de pichadores no segundo andar do prédio da Bienal foi classificada como "terrorismo poético" e "intervenção artística" por seus defensores e de "vandalismo" e "atitude autoritária" pela declaração oficial da Bienal

A primeira foi proposta como trabalho de conclusão de curso (TCC). Pixobomb foi reprovado, expulso da faculdade, fichado na delegacia com mais cinco amigos e processado por danos. A segunda ação queria atacar "uma bosta de galeria" que "abriga artistas do underground, então, é tudo nosso", nas palavras da carta de convocação. Esse protesto rachou em discussões e ameaças os pichadores e os grafiteiros que estão levando seus trabalhos para circuito.

A turma de Pixobomb se intitula "PiXação: Arte Ataque Protesto" é formada por dezenas de jovens entre 15 e 30 anos da Grande São Paulo que se conheceram nas ruas. A garota presa é uma exceção: a gaúcha Caroline conheceu o grupo pela Internet.

Outras intervenções clandestinas na mais tradicional exposição de São Paulo não tiveram desfecho tão drástico. O grupo Arac, por exemplo, colou adesivos nas pilastras e paredes do prédio e publicaram em blog um Manual para a Invasão da Bienal. Já estudantes de publicidade promoveram um flash-mob (expressão inglesa que significa multidão instantânea) com suas camisetas formando a pergunta: "Sem idéia?", filmando tudo para passar o vídeo na Web.

A ARTE COMO CRIME

  • Choque/Folha Imagem

    Caroline Piveta é conduzida à viatura, à delegacia e à prisão

  • Choque/Folha Imagem

    Segurança tenta impedir pichador na inauguração da Bienal

  • Divulgação

    Os grafismos na Bienal inspiraram obra do artista Eli Sudbrack

A invasão da pichação inspirou o artista Eli Sudbrack a fazer uma série de peças de neon usando o grafismo exposto na galeria Casa Triângulo, que está instruída a não chamar a polícia caso os pichadores passarem para lá.

"Achei a ação dos pichadores fantástica, de uma coragem inacreditável. Não sei como os curadores não abraçaram o conceito. Deve haver alguma razão política. Só porque a garota não é do mesmo estrato social da elite artística", questiona Sudbrack, que pede uma ação dos artistas para liberar Caroline. "Se a Bienal não tirar ela de lá, temos que fazer algo. Eu mesmo já colei stickers em exposições importantes nos EUA. É um absurdo o que está acontecendo. Ela não é uma criminosa", critica o artista.

Na blogosfera também o apoio foi maior que a recriminação. Vitor Ângelo, que mantém o blog Dus Infernus, relatou o caso do ponto de vista de alguém que estava naquele domingo 26 de outubro às 19h30. "Me deparo com a curadora Ana Cohen descabelada, chamando-gritando pelos seguranças, polícia. Vejo uma manada de jovens em uma coreografia que lembrava os animais livres da savana correndo e gritando por liberdade de expressão. Não resisti, aplaudi forte como muitas outras pessoas", escreveu Ângelo, para logo teorizar.

"A Bienal ao apagar os pixos assim como a grande maioria dos senhores envolvidos com a tal arte contemporânea estão situados e sitiados no terreno da cultura, já os pichadores, eles estão no terreno da arte", completou, citando frase do cineasta francês Jean-Luc Godard ("Cultura é regra, arte é exceção").

A organização afirmou antes da abertura da Bienal que sabia da ação dos pichadores, mas só reforçou o policiamento, com revista de bolsas, após o incidente no primeiro dia da exposição. Na hora da confusão, os seguranças tentaram conter os protestantes até a chegada da polícia. A maioria escapou após quebrar um dos vidros do prédio.
 
 
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Ralf Rickli • arte em idéias, palavras & educação
http://ralf.r.tropis.org • (11) 8552-4506


e

www.myspace.com/gunnarvargas

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... fotos ameríndias e africanas ...

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Olha só que foto, gente!
 
 
Ela é um detalhe de uma foto maior que saiu no seguinte link:
 
 
Além disso, quero comunicar que criei um álbum picasa para FOTOS DA ÁFRICA - no aspecto histórico-cultural, não no de natureza. Por enquanto quase só tem fotos da Etiópia, mas já tem muuuuita coisa bonita pra ver. 95 fotos só pra começar... Quem quiser olhar, é http://picasaweb.google.com.br/pluralf/SeleOAfricana
 
Abraço forte,
Ralf
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mulher presa há 40 dias por 'INTERVENÇÃO' verdadeira na Bienal !!!

GENTE, ISTO É INACREDITÁVEL!!! 
 
QUANTA HIPOCRISIA
DA DONA BURGUESIA!!     (Ralf)
 
 

04/12/2008 - 07h01

Artistas cobram iniciativa da Bienal para liberar pichadora presa há 40 dias

Rodrigo Bertolotto
Do UOL Notícias
Em São Paulo (SP)
Caroline Piveta da Mota, 23, entrou no prédio da Bienal de São Paulo, pintou com spray uma parede e está presa há 40 dias. Levada ao 36º Distrito Policial , na rua Tutóia, três dias depois foi aprisionada na Penitenciária Feminina Sant´Ana, no Carandiru.

PICHAÇÃO E DETENÇÃO

  • Talita Virginia/Folha Imagem

    Segurança da Bienal avista Caroline escrevendo o nome...

  • Talita Virginia/Folha Imagem

    ...da gangue Sustos nas paredes do segundo andar (planta vazia) ...

  • Talita Virginia/Folha Imagem

    ...e acaba detida por PM que foi chamado pela organização

As últimas palavras a caminho da viatura foram: "Eu sou pichadora" e "Viva a pichação". Isso aconteceu no primeiro dia do evento, que termina no próximo sábado marcado por esse caso policial.

A ação no segundo andar do prédio (a "planta do vazio") foi classificada como "terrorismo poético" e "intervenção artística" por seus defensores e de "vandalismo" e "atitude autoritária" pela declaração oficial de uma Bienal que tinha como lema "Em Contato Vivo" e prometia refletir sobre a arte contemporânea e o circuito artístico.

"Isso é uma hipocrisia absurda. Quem devia ser preso são os organizadores. O andar vazio era um convite à manifestação, à contravenção. O mínimo que a Bienal pode fazer é colocar seu advogado para liberar a moça", afirmou o artista José Roberto Aguilar.

Fora a declaração em 27 de outubro, a curadoria da mostra não quis se manifestar sobre o assunto. Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen foram procurados pela reportagem do UOL desde a semana passada, sempre alegando por meio da assessoria de imprensa que não tinham espaço em suas agendas.

Quem falou foi Rafael Vieira Camargo Martins, 26, o amigo de Caroline que foi preso ao levar os documentos da garota no DP. Ele foi reconhecido pelos presentes na delegacia e acabou detido por oito dias. "Fui à Bienal porque vi as mensagens pela Internet falando da invasão. Mas não pichei nada. Fui só ver. Eles não conseguiram provar e me liberaram", contou em conversa telefônica.

Taxista na região do Ipiranga, ele afirmou que perdeu dias de trabalho e a auto-estima com a prisão. "Com que cara eu fico diante de meus passageiros, sabendo que eu estive na cadeia? Os policiais me zoaram, mas os companheiros de cela me ajudaram", conta Rafael, que participará nos próximos dias de uma manifestação pedindo a libertação da amiga.

Ele deve visitar a amiga na penitenciária no próximo domingo. Ambos estão sendo processados por destruição do patrimônio público e podem pegar uma pena de três anos de reclusão. Aponta-se envolvimento em outras duas ações anteriores, em junho no Centro Universitário de Belas Artes (Vila Mariana) e na galeria Choque Cultural (Vila Madalena). As três iniciativas teriam como mentor Rafael Guedes Augustaitiz, conhecido no meio como Pixobomb, e foram registradas em vídeos ou fotos.

Dê a sua opinião

A ação de pichadores no segundo andar do prédio da Bienal foi classificada como "terrorismo poético" e "intervenção artística" por seus defensores e de "vandalismo" e "atitude autoritária" pela declaração oficial da Bienal

A primeira foi proposta como trabalho de conclusão de curso (TCC). Pixobomb foi reprovado, expulso da faculdade, fichado na delegacia com mais cinco amigos e processado por danos. A segunda ação queria atacar "uma bosta de galeria" que "abriga artistas do underground, então, é tudo nosso", nas palavras da carta de convocação. Esse protesto rachou em discussões e ameaças os pichadores e os grafiteiros que estão levando seus trabalhos para circuito.

A turma de Pixobomb se intitula "PiXação: Arte Ataque Protesto" é formada por dezenas de jovens entre 15 e 30 anos da Grande São Paulo que se conheceram nas ruas. A garota presa é uma exceção: a gaúcha Caroline conheceu o grupo pela Internet.

Outras intervenções clandestinas na mais tradicional exposição de São Paulo não tiveram desfecho tão drástico. O grupo Arac, por exemplo, colou adesivos nas pilastras e paredes do prédio e publicaram em blog um Manual para a Invasão da Bienal. Já estudantes de publicidade promoveram um flash-mob (expressão inglesa que significa multidão instantânea) com suas camisetas formando a pergunta: "Sem idéia?", filmando tudo para passar o vídeo na Web.

A ARTE COMO CRIME

  • Choque/Folha Imagem

    Caroline Piveta é conduzida à viatura, à delegacia e à prisão

  • Choque/Folha Imagem

    Segurança tenta impedir pichador na inauguração da Bienal

  • Divulgação

    Os grafismos na Bienal inspiraram obra do artista Eli Sudbrack

A invasão da pichação inspirou o artista Eli Sudbrack a fazer uma série de peças de neon usando o grafismo exposto na galeria Casa Triângulo, que está instruída a não chamar a polícia caso os pichadores passarem para lá.

"Achei a ação dos pichadores fantástica, de uma coragem inacreditável. Não sei como os curadores não abraçaram o conceito. Deve haver alguma razão política. Só porque a garota não é do mesmo estrato social da elite artística", questiona Sudbrack, que pede uma ação dos artistas para liberar Caroline. "Se a Bienal não tirar ela de lá, temos que fazer algo. Eu mesmo já colei stickers em exposições importantes nos EUA. É um absurdo o que está acontecendo. Ela não é uma criminosa", critica o artista.

Na blogosfera também o apoio foi maior que a recriminação. Vitor Ângelo, que mantém o blog Dus Infernus, relatou o caso do ponto de vista de alguém que estava naquele domingo 26 de outubro às 19h30. "Me deparo com a curadora Ana Cohen descabelada, chamando-gritando pelos seguranças, polícia. Vejo uma manada de jovens em uma coreografia que lembrava os animais livres da savana correndo e gritando por liberdade de expressão. Não resisti, aplaudi forte como muitas outras pessoas", escreveu Ângelo, para logo teorizar.

"A Bienal ao apagar os pixos assim como a grande maioria dos senhores envolvidos com a tal arte contemporânea estão situados e sitiados no terreno da cultura, já os pichadores, eles estão no terreno da arte", completou, citando frase do cineasta francês Jean-Luc Godard ("Cultura é regra, arte é exceção").

A organização afirmou antes da abertura da Bienal que sabia da ação dos pichadores, mas só reforçou o policiamento, com revista de bolsas, após o incidente no primeiro dia da exposição. Na hora da confusão, os seguranças tentaram conter os protestantes até a chegada da polícia. A maioria escapou após quebrar um dos vidros do prédio.
 
 
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